sábado, 7 de maio de 2011

Assim, no meio da noite, quando não tinha mais nada pra fazer ela resolveu pensar. Sabia que esse era um exercício que poderia se tornar perigoso, mas resolveu arriscar. Abriu a janela de leve, só pra tentar ver se a lua estava lá olhando por ela, acendeu um cigarro e encostou-se na janela, virada pra dentro do quarto. Faltavam os pensamentos, nem conseguia perceber que só de pensar em pensar já estava pensando. Analisava os acontecimentos do dia, as emoções que sugavam tudo de bom e de ruim que ela podia ter por dentro, a única certeza era que ela estava confusa, dias e noites, a dentro e a fora sentindo na pele o preço que o amor cobra quando se torna insustentável. A dor de perder, de não ter, de buscar em si foi misturada à alegria de lembrar do que ficou de bom, a vontade de ter perto, a necessidade desesperada de tentar salvar o sentimento que ainda pulsa. Ah, como ela se sentia confusa, a clareza com que via as coisas assustava, o medo estava presente, fazendo parte da angústia que dominava os dias frios do inverno que estava começando. Mais um tragada no cigarro, um espiada na lua, só por garantia que alguém olhava por ela e sentou na cama.
Um sorriso tenso acompanhava os olhos lindos, verdes, que olhavam longe como se buscassem salvação no tempo, como se quisessem chegar no dia que a dor não iria mais incomodar, era uma tentativa de acalmar o que ardia e queimava dentro dela, os sentimentos. Mas ela sabia que esses não tem como enganar, por mais disfarçado que seja a gente sabe que uma hora eles aparecem, devoram, crescem e nos comem, é, comem. Sentimento devora cada pedacinho da gente, consomem a nossa energia, nos movem. E a gente foge, tenta enganar, faz de conta que eles não existem, tranca o coração a sete chaves achando que nunca mais alguém vai conseguir abrir. Um dia alguém consegue, se nós descuidarmos um pouco, alguém abre e esse alguém pode ser a gente mesmo, talvez ela pensasse nessas coisas sem muitas esperanças, eram apenas divagações de uma pessoa cansada de não saber o que esperar.
Deitou-se, a cama cheia de cobertas que pareciam não esquentar, mas o frio estava por dentro, estava nela. Fechou a janela, despediu-se da lua, olhou no relógio três e vinte, madrugada fria, voz calada, latidos ao fundo, cinzeiro cheio, disco parado, muitas cobertas, espaço sobrando, luz faltando. De repente, cai dos olhos uma lágrima, ela já não acreditava que ainda existiam lágrimas. Acomodada no leito, olhando no escuro não via nada, muito menos a sua cara lavada, inchada e vazia, fechou os olhos e decidiu parar de pensar, mesmo sabendo que isso era impossível.
Virou-se na cama por muitos minutos, quase uma hora depois o corpo resolveu dar um tempo, relaxou todos os músculos, abraçou o travesseiro e aconchegada nas muitas cobertas adormeceu. Sua cabeça? Essa não parou de pensar, foram sonhos intensos, como os últimos dias.
Acordou tarde, abriu a janela e viu que a lua não estava mais lá olhando por ela. Pensou que o sol também não poderia olhar por ela, porque naquele dia ele não tinha aparecido. Olhando longe, com um olhar que ultrapassava o teto resolveu viver aquele dia. Pulou da cama, vestiu-se e saiu de casa acompanhada de sua angústia, o seu medo, um casaco grosso e vontade. Vontade de um café forte, um cigarro e viver os dias até quando o tempo resolver que já é o dia de pegar as sete chaves.

Um comentário:

isadora machado disse...

ai ana. é triste ser tao linda toda essa tua angústia\ansiedade\desconforto em linhas. chocolate para os dias de espera..